A cirrose hepática é o estágio final das doenças crônicas do fígado. Quando esse órgão sofre um processo inflamatório ou dano persistente, o seu tecido é progressivamente substituído por fibroses (cicatrizes). Esse processo, ao longo dos anos, forma nódulos no fígado e leva à perda de função hepática.
As principais causas da cirrose hepática no Brasil e no mundo são o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, infecção pelos vírus das hepatites B e C e a doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA). Mas ela também pode ser causada por doenças hereditárias, metabólicas, autoimunes, medicamentosas e idiopáticas.
Sua consequência mais importante e precoce, sobre a qual falaremos hoje, é a Hipertensão Portal (HP). A HP é resultado do aumento da resistência intra-hepática combinada ao aumento do fluxo sanguíneo no sistema portal, o que leva ao desenvolvimento da circulação hiperdinâmica e que mantém o regime de hipertensão, mesmo após a formação de circulação colateral.
A hipertensão portal é definida como uma elevação de pressão acima de 10mmHg na veia porta e seu território. Também pode ser definida, de maneira mais adequada, através da aferição do gradiente de pressão na veia hepática (GPVH), sendo considerada HP quando sua medida excede 5mmHg., mas é um exame invasivo e por isso pouco utilizado na pratica clínica. Sua classificação varia de acordo com o local de aumento da resistência vascular, podendo ser pré-hepática, intra-hepática ou pós-hepática.
É fundamental avaliar a hipertensão portal pois as principais complicações da cirrose decorrem do seu desenvolvimento, como a Hemorragia Digestiva Alta (HDA), ascite (popularmente chamada barriga d’água), hidrotórax ( água na pleura), Peritonite Bacteriana Espontânea (PBE), Encefalopatia Hepática (EH), Síndrome Hepatorenal (SHR), Síndrome Hepatopulmonar (SHP), Hipertensão Portapulmonar (HPP) e cardiomiopatia.
O aumento progressivo da hipertensão portal é o que determina a apresentação clínica da cirrose, bem como a circulação hiperdinâmica, translocação bacteriana e ativação da cascata de inflamação. Com isso, podemos classificar a cirrose em “compensada” ou “descompensada”, levando em consideração a presença, ausência ou história prévia de sangramento varicoso, ascite, icterícia ou encefalopatia. O GPVH também ajuda a definir a descompensação da doença e o desenvolvimento de varizes esofagogástricas, já que elas não costumam ocorrer quando a medida do gradiente é clinicamente insignificante, ou seja, menor que 10mmHg.
A hipertensão portal pode ser diagnosticada com a realização de exames. Dentre eles, podemos citar: (1) a ultrassonografia com doppler, método diagnóstico de imagem e não invasivo, que permite averiguar o parênquima hepático (células do fígado), tamanho do baço, patência e diâmetro dos vasos, presença de circulação colateral e ascite; (2) a tomografia computadorizada ou ressonância magnética, métodos de imagem também não invasivos, que permitem a adequada identificação dos vasos colaterais; e, por fim, (3) a endoscopia digestiva alta, procedimento pouco invasivo, que permite avaliar a presença de varizes esofagogástricas, importantes na complicação da hipertensão portal, além de contribuir para definir a probabilidade de sangramento digestivo.
Existem duas maneiras de avaliar o prognóstico dos pacientes com cirrose hepática. Uma delas é através da classificação de Child-Turcotte-Pugh, que classifica os pacientes em CHILD A, B ou C. As taxas de sobrevivência (de um a dois anos) para essas classes são de 100% e 85% (CHILDA), 80% e 60% (CHILDB) e 45% e 35% (CHILDC). A segunda é o MELD, um modelo matemático que tem a capacidade de predizer a mortalidade num prazo de 3 meses. Quanto maior o MELD, maior a probabilidade de morrer sem o transplante hepático. No Brasil e no mundo, os pacientes são alocados na fila de transplante de acordo com o MELD.